sábado, 29 de setembro de 2012

Hoje a Manif terminou com Janita Salomé!

Janita Salomé, cerveja, vinho e petiscos. Que mais senão uma autêntica festa, afinal sempre é fim-de-semana, pá.

O nosso problema também é este. Vamos para a rua, queremos fazer e acontecer, queremos mudar o rumo das coisas e tal, mas no fim somos todos amigos, está tudo resignado e lá regressamos à velha vidinha de não trocar o certo pelo duvidoso. A rotininha, que remédio.

Começa numa estrutura sindical completamente antiquada, sem ideias, sem a lufada de ar fresco que tão bem lhe fazia. A treta é a mesma de sempre, "os patrões" e os "cães grandes", todo um clima de nós vs eles. Nós - os bons, humildes trabalhadores que tão oprimidos somos - contra eles, os comilões sem mérito nenhum, os preguiçosos que comem tudo e não deixam nada. Saiu Carvalho da Silva, entrou Arménio Carlos, mas visto de longe ninguém diria sequer ter havido uma troca, quanto mais mudança. São iguais, farinha do mesmo saco. E no fim da manifestação, vamos todos beber cerveja e comer bifanas com os camaradas, pá!

Nunca revolução nem protesto nenhum será bem sucedido sem uma organização, uma liderança que garanta que todos se mexem no mesmo sentido. Alguém capaz de unir as tropas em torno de um objectivo comum. Alguém que consiga movimentar as massas para um ataque massivo direccionado para onde realmente interessa atacar, em vez de andar aqui a fazer festinhas no lombo ao inimigo. Enquanto houver PCPs e CGTPs a organizar protestos, manifs e outros que tais, nunca resultado nenhum será obtido em termos práticos. Porque eles são parte do sistema, podem até ser a parte que aparentemente representa o povo mas continuam a ser parte do sistema. E o sistema está podre, viciado e controlado. 
A haver uma verdadeira força mobilizadora, terá que ser alguém externo à esfera política, que não tenha interesse nem fatia de bolo a comer nas partes interessadas, porque estes pacóvios sindicalistas e comunistas andam cá simplesmente a cumprir calendário. E o povo olha tanto mas vê tão pouco, que não se apercebe que anda a correr em círculos há anos sem fim. Lutam, lutam, lutam para fazer cair o governo, aplaudem o novo governo para voltar a lutar para que eles caiam quatro anos depois. E volta a aplaudir o próximo, "este sim", que é nada mais que mais uma peça no tabuleiro a soldo dos grandes interesses. 

Posto isto, eu não creio que a solução passe por uma queda ou demissão do governo. Não vai resolver nada, vamos apenas queimar recursos e iniciar mais um ciclo de tretas, balelas e muito media entertainment para inglês ver. Mais circo, mais eleições, mais discursos sob coro de aplausos, mais capas do Correio da Manhã e mais slogans políticos, terminando tudo com a imperial subserviência aos grandes lobbys financeiros e corporativos. Não há volta a dar, porque o sistema político e mediático está viciado a tal ponto que se leva pessoas a votar num jotinha que acabou o curso com 36 anos e que nunca trabalhou a sério na puta da vida, acreditando que pode vir a ser a alternativa de que o país precisa. Mas andamos todos a brincar, amigos? Será que ninguém abre a pestana e vê que estamos a ser governados por marionetas? Será que ninguém vê que estamos a falar de pessoas cuja melhor (diria até única) qualidade é o domínio da hipocrisia e do discurso, orientados pela psicologia de multidões? Porque raio continuamos a protestar contra a Troika e contra a União Europeia, que respectivamente nos emprestam dinheiro mesmo sabendo que somos uns esbanjadores irresponsáveis e nos levam a reboque no comboio do desenvolvimento? Serão eles os culpados da nossa gritante falta de bom senso, do facto de termos construído uma casa começando pelo telhado? Serão eles os culpados de termos abandonado a agricultura e a pesca e nos tenhamos tornados dependentes das importações e consequentemente deixado de ser auto-suficientes? Ou serão eles os que continuam a levar-nos a rasto mesmo sabendo que somos peso morto?

Há que ter noção de contra quem nos temos que manifestar e qual o alvo a abater. Não é a troika, a Merkel ou qualquer outro elemento da UE. O alvo a abater é o nosso sistema político, que está completamente corrompido, que põe interesses pessoais, privados e corporativos à frente do bem estar do seu povo, da estabilidade financeira ou de qualquer desenvolvimento ou equilíbrio social dos indivíduos que são seus cidadãos. São os governos que continuam a acabar com os poucos recursos que temos, gastando onde mais lhes interessa, sem uma visão de médio-longo prazo debruçada sobre o emprego, o trabalho e a auto-suficiência que qualquer país precisa para ser financeiramente autónomo. Sim, tudo o que não temos. Se não temos, como podemos acreditar que uma saída da UE será realmente em algum ponto benéfica? Se não conseguirmos pagar ao FMI, como raio poderemos pagar a quem quer que seja se decidirmos sair da UE e não pagar a dívida? Não há forma de querer ser independente e auto-suficiente sem criar as bases para essa condição. Os nossos defeitos são estruturais, não circunstanciais. Quer fiquemos ou saiamos, quer paguemos ou não paguemos, o nosso sistema político encarregar-se-á de nos espremer sempre mais um bocadinho, sob o discurso fácil de a culpa ser do anterior governo, e que "é preciso dar um passo atrás para dar dois à frente". Vamos continuar a acreditar que o crescimento chegará em 2013, em 2015, depois em 2018 e depois em 2020. Da mesma forma que andamos a acreditar nisto desde 2008. Pois bem amigos, não chegará. Pelo menos enquanto não conseguirmos mudar o paradigma da nossa política. Não enquanto continuarmos a votar nos do costume e a compactuar com a política da palmadinha nas costas que vemos no parlamento, não enquanto tivermos políticos com sentido de profissão e não com sentido de patriotismo. Não podem haver carreiras na política, deve sim haver serviço público por parte dos melhores profissionais deste país. Tal qual o serviço militar. Pôr as mentes brilhantes ao serviço da força trabalhadora dos menos brilhantes, mas não menos importantes. Como uma verdadeira equipa.

Mas é necessário ter-se a noção que isto não é uma mudança fácil ou rotineira, é preciso alterar um paradigma há muito estabelecido e só agora posto a nú porque está a faltar o dinheiro. Defeitos que não apareceram agora, mas que já existem há muitos anos e quase desde sempre. E que vão continuar, porque é demasiado ousado pensar que algum dos media possa dar tempo de antena a alguém que entenda e transmita isto, e como tal esta linha de pensamento nunca chegará aos ouvidos ou à compreensão do povão. Porque o povão come o que a SIC e a TVI querem que eles comam, entretêm-se como bebés com o colorido da propaganda política e com o barulho estridente do ciclo político, esse que começa e acaba com a mesma naturalidade para dar lugar ao próximo boneco de marioneta. A era dos media tem destas coisas. O povo não está mais inteligente nem mais culto que em 1974, está pelo contrário mais emburrecido, menos capaz de pensar. O povo é hoje um bando de vegetais, alimentados com o que os media lhe dão e querem que veja e oiça, e não com o que realmente quereria ou devia ver e ouvir. E como eu sei, tu sabes e ele sabe - porque nos ensinaram a saber - "se está na televisão é porque é verdade"...


Pelo menos para mim...

Sábado de manhã é para passar estendido ao comprido. Yap, haters gonna hate.

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

O primeiro QR Code em calçada portuguesa é um mimo



Isto é apenas uma amostra do que se pode fazer pelo turismo em Portugal: muito. Falta é criatividade e visão da parte dos ilustres autarcas, mas isso são outros quinhentos.

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Dani Alves falou!

Daniel Alves, indivíduo conhecido pelo seu alargado intelecto e raciocínio peculiarmente desenvolvido, particularmente entre Mourinho e os seus pares, falou. Falou, e disse que o Barcelona e o Benfica têm um futebol igual, com a mesma filosofia de jogo e que entendem o futebol da mesma forma. Não fosse o tal mundialmente reconhecido intelecto do Dani Alves e ia achando que era um mind-game para pôr o Jesus com o ego nos píncaros, tendo presente que é manifestamente essa a melhor forma de se pôr o Catedrático a estender-se a todo o pano pelo chão fora completamente por sua conta. 

Mas tecnicamente falando - ou no aspecto técnico-táctico para quem fala Jesulês - o iluminado brasileiro tem a razão toda no que diz, de facto. Começando pelos respectivos meios-campos, onde de um lado se joga com 4 médios centro e do outro com 2, passando pelo facto de uma equipa jogar em ataque apoiado e sustentado, articulado com troca de bola em espaço curto, e a outra ainda estar para descobrir que também se pode jogar pelo meio e que há vida para além dos flancos. 

Tirando isso tudo, só vejo um argumento para que seja admissível ver o Barcelona pôr-se em bicos de pés tentando comparar-se ao Benfica. E mesmo assim, acho que o facto de terem o segundo melhor jogador do futebol actual e nós o melhor, e ambos serem argentinos, é muito poucochinho para bufarem assim. Mas pronto, vão falando...

domingo, 23 de setembro de 2012

Hoje é domingo, não é?

Que parvoíce, claro que é domingo. Não só é domingo, como é também domingão! Ou seja, não é apenas o dia que está entre o sábado e a segunda-feira, é também o bom velho dia da t-shirt de dormir e do cu alapado no sofá com o pacote de bolachas em cima da mesinha, bem ali à mercê de saciar qualquer bichinho que teime em aparecer. 

O outono chegou, amgos. Chegou e trouxe-nos o bom velho domingão. O domingão em que chove lá fora, ninguém vai à praia, à piscina e nem tão pouco alguém ousa pôr um dedo fora de casa, quanto mais passar a tarde no corte-e-costura numa qualquer esplanada. Aliás, qualquer uma destas saídas me parecem agora de uma loucura extrema, algo que só faria num domingão se estivesse efectivamente, louco. Aliás, é neste ponto que o paradigma do chinelo evolui da havaiana para o chinelo de quarto, ou nos casos mais sérios, a pantufa. É neste ponto que esquecemos o calção e nos amigamos de novo dos saudosos jeans, abandonados, desprezados e inusáveis no Verão - a menos que tivesse mesmo que ser, ou que a noite estivesse fresquinha. Os ténis de pano, baixinhos e airosos, têm definitivamente que encarar a sua temporada de hibernação, por muito que lhes custe - "meus caros, foram bons tempos but it's time to say goodbye". Tem que ser tem que ser, e o tem que ser tem muita força. Venha de lá essa bota, essa Merrell ou coisa que o valha, don't bring knifes to a gunfight que isto está a ficar frio.

Mas calma, que isto está longe do fim. Porque ainda está para vir a derradeira troca, traição digna de qualquer vigarista de rua num policial americano dos anos 80. Este é o ponto em que trocamos a cerveja geladinha pelo tinto au naturel. Não que se abandone um ou outro durante o resto do ano, nada disso, também não somos nenhuns animais sem sentimentos. Mas é inegável que somos um bocado bígamos, vá lá. Vamos para um lado ou outro conforme nos dá jeito, procuramos numa as palavras amigas que outra não é capaz de nos dizer e encostamos a custo os companheiros de tantos dias e noites a uma prateleira fria, vazia e sem réstia de humanidade até simplesmente nos lembrarmos que existem e que podem bem assistir-nos naquela hora de fraqueza. Não se faz.

Podia começar agora mesmo uma manif em defesa das bebidas sazonalmente abandonadas. Também podia tentar começar um movimento nas redes sociais, mais isso faria de mim uma daquelas que pessoas que odeio, essas que passam o dia inteiro a partilhar frases tão lindas e tão cutchi-cutchi que até fariam chorar um olho de couve. Não me parece. Não me safaria lutando sozinho, parece-me. Não, definitivamente não me safaria. Portanto, talvez siga a velha máxima, que mais? Talvez continue então apenas a lamentar esta crueldade que nós, a espécie masculina, comete sem qualquer rasto de escrúpulos ou dignidade... Mas afinal me junte a eles, já que não posso vencê-los. Não me julguem, que posso eu fazer? 

E então é tempo do velho vino, companheiro de noites frias e cenários melodramáticos, repintados com o cinzento do outono e temperados com o molhado da chuva a bater no vidro desprotegido, enquanto cá dentro uma reunião informal de alguns dos maiores bandidos que esta rua já viu tem lugar junto ao lume, faca afiada e conversa em riste:

- Não pode ser... A sério, como é possível ser-se tão burro?
- Se achas que esta é boa, espera até ouvires o que fez aquele caralho no outro dia...
- Conta lá, estou mesmo a ver!
- Já conto. Deixa-me só encher-te o copo, não te quero ver com sede nesta casa...
- Então dá-me um cigarro dos teus que o meu maço acabou há pouco... O isqueiro?
- Está aqui. Bem, ia eu dizendo...

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Não sei bem...

Talvez seja velhice. Ou talvez falta de paciência. Ou talvez esteja a fritar a pipoca de vez, quem sabe?

De qualquer forma, no mínimo soaria estranho àquele rapagão - bonito - que deixei para trás há 6 anos, se lhe dissesse que viria por aí adiante um fim-de-semana em que ele se levantaria da manjedoura duas vezes (yap, sábado e domingo) à mesma hora em que se levanta durante a semana para trabalhar... Mas desta vez para ir andar de bicicleta. E sem sair à noite. E sem abusar do "social drinker" nem um bocadinho. 

Sinal dos tempos, sinal de insanidade, sinal de quê? Não sei. Que se foda. Hajam pernas.

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Momento musical de hoje

... versão Thiago Pethit e o seu talento do tamanho do mundo.



sábado, 1 de setembro de 2012

Uma Fábula Moderna: Vieira e os sapatos novos




Deixem-me contar-vos uma história. É a história de um senhor que precisava de um par de sapatos.

O Sr. Vieira era um homem grisalho, na casa dos seus 50. Tinha um trabalho importante numa empresa multi-nacional, comandava muita gente fazendo uso do seu jogo de cintura e da demagogia, que os pobres subordinados engoliam encolhendo os ombros.

Pela sua posição profissional e social, tinha absoluta necessidade de não cometer erros quanto à sua indumentária. É um mundo de dog-eat-dog, e facilitar era morrer. 

A certa altura, o Sr. Vieira (chamemos-lhe aleatoriamente assim) tinha uma reunião importante que lhe podia garantir uma promoção que procura há dois anos, sem sucesso. Precisava de uns sapatos, porque os dele não serviam e precisava mesmo de usar uns bons sapatos. 

A caminho da baixa, onde estava o comércio onde habitualmente comprava, lá ia o Sr. Vieira a pensar no tipo de sapatos a comprar. "Bem, no ano passado usei aqueles sapatos conservadores, não fiz grande figura. Óptimo era arranjar uns sapatos daqueles modernos, polivalentes, como os que tive há dois anos. Esses sim, grandes sapatos. Vai ter que ser isso, não estou a ver é onde vou arranjá-los", pensava com os seus botões.

Nisto passa em frente a uma lojinha pequena, de esquina e chama-lhe a atenção a montra. Vê um belo casaco - "que encanto!", diz para si. "Mas já tenho 6 casacos... Bem, os bons casacos nunca são demais, o inverno é longo e decerto haverão oportunidades para usar todos. Além disso o Alexandre disse que estava interessado naquele meu casaco, às tantas ainda lho vendo... Mais vale levar já este para prevenir, de qualquer forma". E pronto, lá trouxe o casaco. Dos 200 euros que levou, já só restavam 120. Mas tudo se haveria de compor, tinha que bater certo...! 

Duas ruas abaixo, o Sr. Vieira passa em frente a um novo espaço, sobre o qual tinha ouvido na rádio, um género de outlet que exibe um cartaz - "aceitamos a sua roupa usada". "Ora se não é mesmo isto que me dava jeito... Tenho de facto umas camisolas que não vou usar, e sempre aproveito para arranjar algum espaço no armário". Pagavam mal, mas bem, sempre são uns trocos. E elas lá estavam paradas de qualquer forma, portanto não está mal. E bem, foi assim que nessa tarde o Sr. Vieira se viu livre das camisolas a mais, ficando agora com as 4 camisolas de que precisa para passar o Inverno. "Perfeito", pensou para com os seus botões.

Continuando a sua rota, o Sr. Vieira passa pela loja do seu amigo Torres. Torres era um velho parceiro de negócios de Vieira, que estava agora à frente desta loja, muito antiga e com muitos recursos. Lá decide entrar para cumprimentar. 

- Olha quem ele é, então como estás amigo Vieira?
- Nada mal Torres, nada mal. Acabei de comprar agora este casaco...
- Epá, não está feio, não senhor. Mas sabes que esse padrão é um pouco avant-garde, não se vai usar já, já. Podias ter falado, eu arranjava-te aquele casaco que te emprestei há dois anos, não o uso e fazia-te um preço porreiro nisso. 
- Epá, realmente. Nem me lembrei disso, pôrra. Mas é de facto um casaco e pêras. Estás a pedir quanto por ele, mesmo?
- Por ser para ti, 120. Sabes bem que entre nós o preço é sempre jeitoso para o teu lado...

O Sr. Vieira engoliu em seco. De facto adorava aquele casaco, que usara durante um Inverno há dois anos e que tão bem lhe ficava. Mas 120 é precisamente o dinheiro que tinha para os sapatos. Merda!

- Não fazes um descontinho nisso, sequer?
- Vieira, sabes que não posso. 120 é bom preço.
- Que se foda, venha daí o casaco. Aqui tens os 120 euros. 
- Bom negócio, Vieira, bom negócio. É sempre um prazer, aqui tens.

Descendo a rua, o Sr. Vieira ia tão contente com os seus dois casacos novos como apreensivo quanto ao facto de não ter os sapatos que precisava. Merda, agora estava mais que bem servido de casacos mas ainda sem sapatos, e amanhã já tem que ir trabalhar. "Bem, só se passar em casa do Torres mais logo, a ver se ele me empresta aqueles sapatos que ele lá tem encostados, não são maus e vão dar para me desenrascar". E assim fez, voltou para casa e logo à noite passaria sem falta em casa do Torres.

- Triiing!! (campaínha)
- Olha o Vieira, então rapaz, como estás? 
- Torres, preciso de um favor teu. Epá, sabes que hoje te comprei aquele casaco, e daí nada a dizer. Mas agora fiquei com um problema, precisava que me emprestasses aqueles sapatos que aí tens e não usas, ia-me desenrascar para a reunião deste ano e logo se via. 
- Epá, oh Vieira... Sabes que não é má vontade, mas só te empresto os sapatos se me emprestares o teu casaco, aquele que usas sempre que faz chuva. 
- Oh Torres, mas preciso dele... Não dá mesmo. 
- Então esquece. 
- Ok, tu é que sabes. Até logo.

Voltando para casa, a cabeça do Sr. Vieira dava voltas e mais voltas. Onde raio ia agora desenrascar os sapatos a esta hora da noite, e amanhã já tinha que ir trabalhar. "Estou fodido", pensa.

Nisto toca o telemóvel. "O 'Árabe'? As estas horas? Que raio quer ele?" - 'O Árabe' era o ricaço da zona, quando queria alguma coisa nada o detinha até conseguir. "Não pode vir boa coisa", pensou o nosso amigo Sr. Vieira.

- ...Tou?
- Vieira? Era mesmo contigo, companheiro. Preciso que me vendas as tuas calças, hoje mesmo.
- Nem pensar, pá. Só tenho mesmo aquelas, ia ter que passar o inverno todo a remediar-me com calções e etc?
- Dou-te 200 euros.
- Epá... Ao menos os 300. 
- 200. E depois dou-te mais 30 euros se ela se mostrarem jeitosas.
- Ok, negócio fechado. 

Vieira pensou que aqueles 200 euros lhe dariam um jeitaço, afinal tinha acabado de gastar os seus 200 euros em casacos de que afinal nem precisava tanto e continuava sem sapatos. 

"Bem, vou só vestir-me muito rápido e vou ao shopping ali na baixa que ainda está aberto até à meia-noite", apressou-se a concluir. Eram 11 da noite e o Sr. Vieira tinha que a reunião já amanhã. Não tinha calças nem sapatos, não podia ir trabalhar sem eles, era a desgraça. Ao abrir o armário, no entanto, algo lhe salta à vista. Dá-se conta de que uma das camisolas que lhe tinham restado não era bem o que precisava, era amarela e difícil de combinar com outra peça de roupa qualquer. "Agora também não posso ir buscar de volta as outras!" - pensou, inquieto. Precisava de substituir aquela camisola também. E o tempo a passar, que raio!

Chegado ao shopping, Vieira vai direito à loja das camisolas. Repara numa camisola vermelha, que até nem é barata mas é de qualidade aceitável. Bem, pode ser.

- Vou levar esta camisola, por favor. 
- São 50 euros, senhor. 
- 50 euros? Mas não é da colecção passada? Vai ter que me fazer um desconto...
- Não posso, senhor. Não arranja uma parecida em lado nenhum, muito menos a esta hora.
- Então e se lhe deixar aqui esta, que já não uso? 
- Faço-lhe por 45 euros, então. 
- 45? Não pode ser, tem que baixar mais!
- Não adianta, senhor. São 23h55 e se quer a camisola tem que se despachar.
- SÃO O QUÊ?!
- 23h55, senhor. 

Vieira estremeceu. Não quis saber mais do negócio, deu os 45 euros e a camisola amarela e correu em direcção à loja das calças, já nem queria saber dos sapatos. 
Tarde demais. Tinha acabado de fechar, a tal loja. "Estou tão fodido", pensou.

E estava. O Sr. Vieira não podia vacilar, ele que procura ser promovido há dois anos, sem sucesso, em favor do seu arqui-inimigo, um vencedor nato, sempre organizado e imperdulário. O Sr. Pinto era de facto um profissional exemplar, e mais uma vez o Sr. Vieira ia ficar mal na fotografia ao lado dele. Amanhã lá estaria na reunião o Sr. Pinto, bem vestido da cabeça aos pés, preparado e à altura da ocasião. E o Sr. Vieira, bem, o Sr. Vieira estava completamente desgraçado. Ia-se tentar arrumar o melhor que consegue, mas acabou o dia com casacos a mais e bem servido de camisolas - mas sem umas únicas calças e nem um par de sapatos. Terá que usar calções e chinelos, à chuva e ao frio. Havia que encarar, estava completamente na merda. E pensar que tudo o que precisava era de um par de sapatos... 


PS: Não há um final feliz. Mas o facto é que a história se baseia em factos reais, também eles de final  habitualmente algo infeliz...